quinta-feira, 5 de maio de 2011

O MATERIALISMO DOS MARXISTAS NÃO É DE MARX

O Termo  marxismo
1º Temos de partir do significado do sufixo ismo da língua portuguesa: Toda a palavra que leva este sufixo tem, a princípio, o significado de doutrina; modo de proceder; relação, doença.
2º Doutrina em Grego significa “ paideia” substantivo feminino, vem de pais paidos que significa criança, pode-se traduzir por educação, (educação, ensino, exercício com as crianças).
No Grego do Novo Testamento (Sagrada Escritura) paideia significa correcção, castigo divino, método de ensino, formação, conhecimento, ciência, arte de fazer qualquer coisa, juventude.
Mutatis mutandis:
Subsídio Gramatical: o que fizemos é um exercício de retroversão, acto que consiste em traduzir para a língua original um texto já traduzido, ou seja, partimos do termo em português para o seu equivalente em grego. Dado que o exercício de tradução consiste em partir da língua original (como o grego) para outra língua (o português, por exemplo).
No Dicionário de Filosofia de Nicola Abbagnano não aparece o termo marxismo. Entretanto, aparecem os termos materialismo dialéctico e materialismo histórico.
No Dicionário de Termos da Fé de Autores Vários o termo marxismo é definido assim: doutrina de Marx e Engels, desenvolvida por Lenine e recebida oficialmente por todos os partidos comunistas. Distingue-se nomeadamente pelo seu ateísmo – Deus não passa de uma ideia arquitectada na imaginação dos homens pelo jogo duma sublimação. O mesmo Dicionário de Marx apenas fala da sua vida e obras
 

3.1. Proposta do Seu Relance Histórico

O materialismo é um fenómeno recorrente na história do pensamento. Ele é encontrado sob formas e matrizes diversas em todas as épocas: na filosofia grega, ele se apresenta como atomismo e epicurismo, na medieval, como averroismo, na moderna como mecanismo. Mas, embora presente em todas as épocas, o materialismo tem a sua máxima afirmação no século XIX, e no século XX transformam-se de simples movimento filosófico em movimento cultural de vastas proporções.
No seu sentido amplo, podemos definir o materialismo como sendo a “concepção filosófica segundo a qual a matéria constitui o que subjaz ou o fundo comum do qual emergem e ao qual se reduzem todas as coisas”[1].
Falando do atomismo, isto na filosofia grega, podemos dizer que este foi devido a Leucipo e Demócrito nos séculos V e IV a.C., depois continuada por Epicuro com o epicurismo.
No dizer destes pensadores, os corpos são constituídos por átomos, átomos estes que são fisicamente indivisíveis, imutáveis, duros, pesados e extensos, que se movem ao acaso no vazio e que se combinam uns com os outros para formar a diversidade dos corpos e as transformações que eles sofrem. Os átomos são o elemento comum a todos os corpos; e o elemento de individualização e o modo como essas combinações se fazem.
Referindo-se ao averroismo, podemos dizer que este é da autoria do filósofo árabe Averróis (1126-1198). Segundo ele o mundo é eterno, e por isso, não teve origem nem por criação, nem por emanação. Afirma a eternidade do mundo e, portanto da matéria e do movimento. A matéria é uma potência universal e o primeiro motor extrai as forças activas da matéria. Este processo realiza-se eternamente e é a causa do mundo sensível e material.
Falando do mecanicismo, isto na filosofia moderna, podemos dizer que este mergulhando as suas raízes no atomismo grego ou seja antigo e nas concepções astronómicas dos gregos e alexandrinos, floresceu no século XVIII. O mecanicismo é a ideia de que o universo pode ser assimilado a um “relógio”, constituído por engrenagens que transmitindo o movimento passo a passo, tentaram explicar a gravitação como sendo uma lei fenomenológica que traduziria muito aproximadamente o efeito de numerosas acções de contacto, num universo cheio de turbilhões.
Um passo adiante na evolução da filosofia materialista no século XIX, é representado por Marx e Engels. Estes partindo do ponto mais alto do pensamento social e científico da sua época, ponderam-se com espírito crítico e criador de quanto de válido a filosofia tinha produzido até aí, e constroem um materialismo novo, o materialismo dialéctico e histórico.
Marx e Engels foram os primeiros filósofos a aplicar o materialismo à compreensão da vida social; a eles se deve a descoberta das forças matrizes materiais e das leis do desenvolvimento social, temas que teremos a oportunidade de ver com mais profundidade nos capítulos que se seguem.  
A procura da razão e das últimas causas da existência das coisas inquietou os homens de todos tempos e lugares, se bem que o empenho na tal empresa se foi diversificando de lugar para lugar e de época em época.
Durante esta procura, do que de facto estava na base do surgimento de tudo quanto existe os homens foram dando suas opiniões. E dentre muitas opiniões encontramos a daqueles que olhando para o que existe, recorrem à matéria como única origem de tudo o que existe. Estes, na sua actividade prática, não põem em dúvida que os objectos que os rodeiam e os fenómenos da natureza existem independentemente deles e da sua consciência. Viram que o que estava à sua volta era apenas matéria, daí a sua atitude materialista.
A segunda razão podemos considerá-la como sendo de ordem ideológica.
Muitos filósofos procuraram com os seus sistemas, explicar o mundo e encontrar as leis gerais segundo as quais ele se move. Ao mesmo tempo queriam esclarecer a essência do homem, e daí deduzir princípios e normas para o seu comportamento prático bem como para a configuração da vida social. Ao fazê-lo, desenvolveram por visões ousada de um mundo melhor e mais justo, não conseguindo, porém, mostrar a forma prática de o alcançar. Na luta contra a ordem social feudal ultrapassada e sentida como justa, digo injusta, por muitos, e contra os ensinamentos da visão religiosa do mundo do feudalismo, os filósofos da burguesia ascendente afirmaram que o homem se deve libertar desses grilhões sociais e mentais, e construir com ajuda da sua razão, uma nova ordem social, que esteja de acordo quer com a natureza humana quer com os princípios da razão e da justiça.
Para tal acontecer era preciso “criar uma nova filosofia que já não pairasse acima do saber concreto e da experiência prática dos homens, mas que trabalhasse filosoficamente esse saber e essa experiência, que os resumisse e generalizasse, por conhecer as leis e as tendências gerais do desenvolvimento do mundo objectivo. Tinha de se criar uma filosofia que não apenas interpretasse o mundo existente, mas que, pela sua ligação à prática revolucionária da classe operária, se tornasse um instrumento teórico da transformação do mundo. Esta filosofia é o materialismo dialéctico e histórico, fundada por Marx e Engels”[2].
O aparecimento do materialismo dialéctico e histórico significou uma revolução na história do pensamento filosófico, e ao mesmo tempo serviu de acicate à transformação da função social da filosofia, que se tornou um instrumento teórico necessário à realização das tarefas e objectivos históricos da classe operária e à transformação activa e revolucionária do mundo.
Dá-se o nome de materialismo à teoria que admite como única realidade a matéria, supondo-a suficiente para explicar todos os fenómenos, quer físicos, biológicos,  fisiológicos, quer mesmo os psíquicos. Nega portanto, a existência da alma, como realidade independente da matéria, considerando-a e a todo o psiquismo como resultado da mesma matéria.
O materialismo de Marx se nos apresenta, no decorrer da evolução do pensamento humano, sob duas modalidades: o materialismo dialéctico e o materialismo histórico.
O materialismo dialéctico “reivindica o monopólio da visão científica do mundo, baseada inicialmente na negação de toda a realidade material. O materialismo dialéctico sustenta que o mundo é exclusivamente material, que se desenvolve segundo as leis da matéria em movimento sem necessidade de qualquer espírito universal. Afirma que a matéria  na base das nossas sensações e conhecimentos, sendo o pensamento produto dela, uma vez chegada a um alto grau de evolução” [3]. Inversamente  ao que outros pensadores sustentavam que as condições sociais e materiais são como que objecto de transformação da mente humana, na visão materialista esta é que é transformada por este mundo material externo. E o determinismo materialista aliado ao determinismo socioeconómico que encontramos em Marx de modo particular nas suas obras juvenis como a Miséria da Filosofia contra a Filosofia da Miséria do socialista francês Proudhon, como já tivemos ocasião de reflectir sobre esta abordagem no capítulo anterior do presente trabalho.
Se no materialismo dialéctico a matéria constitui a entidade última do ser existente, no materialismo histórico o económico representa a entidade suprema do ser social. Este, consiste na tese segundo a qual “não é a consciência dos homens que determina o seu ser, mas, ao contrário, o seu ser social que determina a sua consciência” [4]. Este ser social se reduz essencialmente na sua dimensão económica virada para o material como condição fundamental senão única não só da subsistência mas também da existência humana.
O materialismo histórico “analisa as questões gerais do desenvolvimento da sociedade no seu conjunto: a relação entre os aspectos material e ideal da vida social; a relação entre o espontâneo e o consciente, o objectivo e o subjectivo, no processo histórico; as forças motrizes do desenvolvimento da sociedade; a essência do homem e o seu lugar no mundo actual, etc”[5].
E eis uma formulação ainda mais clara da teoria do materialismo histórico: “Na produção social de sua existência, os homens entram em relações determinadas, necessárias, independentes de sua vontade, em relações de produção que correspondem a determinado grau de desenvolvimento de suas forças produtivas materiais. O modo de produção da vida material, em geral, condiciona o progresso social, político e espiritual da vida”[6].
Podemos dizer que o materialismo dialéctico e histórico encara o mundo tal como ele existe na realidade, examina-o de acordo com os dados da ciência avançada e da prática social. Ou seja, estamos diante de um reducionismo humano ou melhor ainda um humanismo reduzido na visão materialista do mundo e na concepção economicista e mercantilista da existência humana, ou para sermos justos nesta última vertente de analisar Marx, a vida social do homem consiste fundamentalmente em produzir e ter o necessário para existir; o homem é enquanto produz e enquanto tem para produzir em e para a sociedade. Estão aqui as raízes do socialismo sem Deus e que naturalmente relega para o segundo plano a dimensão espiritual da pessoa humana e as suas implicações existenciais. Marx e seus companheiros, como Engels são contra o capitalismo nos seus aspectos explorativos e mercantis, de exploração do homem pelo homem, por causa do lucro desenfreadamente procurado pelo capitalista; entretanto, nesta luta ideológica, estes pensadores (Marx e outros) promovem um humanismo irrealista que nega no essencial a própria natureza humana, privando – a sobretudo de uma das suas dimensões na sua multifacetada e indivisível existência material, espiritual, social, cultural, política, religiosa, lúdica, etc.   

3.2.            O Materialismo Dialéctico

A solução materialista da explicação fundamental do mundo não se restringe à demonstração de que a matéria é primária e a consciência secundária, mas pressupõe também, a revolução daquilo que é considerado respectivamente material e espiritual, o estudo da essência de ambos e a fundamentação científica geral da relação entre a consciência e o ser e entre o espiritual e o material.
O homem está rodeado por uma variedade infinita dos objectos e fenómenos, desde os pequeníssimos átomos e partículas elementares até as gigantescas aglomerações de estrelas e galáxias, das bactérias invisíveis aos animais superiores. Mas existe alguma coisa de comum entre estes diversos objectos, há propriedades inerentes a todas as coisas e fenómenos, independentemente das suas diferenças e mudanças qualitativas. Esta coisa é a “matéria” que é aquilo que não depende de nada nem de ninguém a não ser de si própria, e determina aquilo que é comum a tudo o que existe.
A noção de matéria “compreende uma variedade infinita de objectos, fenómenos, processos existentes fora da consciência, toda a realidade objectiva”[7].
No sentido do materialismo dialéctico, não são matérias apenas os corpos materiais com propriedades mecânicas, mas também todo o mundo material, em todas as suas formas qualitativamente diferentes, com as possíveis propriedades físicas, químicas, biológicas ou também sociais.       
A propriedade essencial, que é comum a todas as formas fenoménicas do mundo material, apesar das múltiplas diferenças, é a propriedade de existir independentemente e fora da consciência humana.
As pessoas de a muito consideravam a consciência, uma das mais importantes conquistas do homem. Graças a ela, o homem desvenda as leis da natureza e sujeita-a à sua vontade.
Podemos dizer que ela é a “visão do que se passa no interior do espírito ou as nossas vivências com maior ou menor clareza”[8].
“Compreende o saber dos homens acerca da realidade objectiva. As sensações, percepções e representações, que são imagens sensoriais concretas da realidade objectiva, fazem tanto parte dela como o pensamento e as imagens mentais abstractas do mesmo e naturalmente também a memória, a capacidade de memorizar imagens tanto sensoriais como ainda abstractas”[9]. A concepção materialista do mundo contínua com a forte influência do idealismo. Ou seja, o materialismo é o idealismo posto de modo inverso; aliás, o próprio Marx a sua luta e crítica contra Hegel consistiu em pôr Hegel de cabeça para baixo: o que é acessório no idealismo – a matéria – é o fundamental, essencial e único no materialismo. Entre o materialismo e o idealismo o meio-termo é difícil, porque não queremos dizer que é impossível.
O materialismo dialéctico recusa a separação absoluta entre matéria e consciência. Tal separação conduz, na realidade a voltar às noções primitivas do primeiro período da história dos homens em que os fenómenos da vida eram atribuídos à acção duma alma que se havia alojado no corpo e que o dirigia, por exemplo, na antropologia platónica. Parecendo que não, este materialismo e a sua antropologia são até certa medida o inverso do platonismo. Entre o platonismo e o materialismo dialéctico existe uma relação de proporcionalidade inversa em termos quer da sua ontologia como a sua antropologia: no platonismo tanto mais se sobrevaloriza o ideal tanto mais se subestima o material, ao passo que no materialismo se sobrevaloriza o material e se subestima o ideal o que neste se chama consciência; no platonismo e idealismo se considera a pessoa humana como essencialmente sendo alma (espírito) no materialismo, o homem é sobretudo na sua dimensão material que se vai transformando dialecticamente segundo a luta de classes ditada pelas condições socioeconómicas. No platonismo encontramos um pré - determinismo da ideia, no materialismo, o determinismo ou a ditadura do material.
O termo “matéria” designa vários conceitos segundo as interpretações semânticas do pensamento filosófico e científico.
Os nossos sentidos revelam-nos a existência de uma realidade externa que podemos ver, tocar, medir, etc., a que damos o nome de “realidade material”.
À medida que os conhecimentos foram se desenvolvendo e os cientistas foram estudando cada vez mais profundamente as propriedades das coisas, foram penetrando na sua estrutura, também foram mudando as noções sobre esta realidade material.
A etapa inicial de conhecimento da natureza caracterizou-se pelo desejo de identificar a natureza, digo matéria com algumas substâncias concretas. “Os primeiros pensadores materialistas da Grécia Antiga na procura do princípio de que decorreu tudo o que existe na natureza, detiveram o seu olhar na água, no ar, no fogo, etc” [10].
A doutrina dos atomistas, Leucipo e Demócrito (séculos IV e III a.C.) foi uma importante etapa no desenvolvimento das noções sobre a matéria. Eles já não identificavam a matéria com qualquer tipo de substância que circunda o homem, embora a noção de material de que são compostos todos os corpos se tenha mantido. A esta realidade material, eles denominaram “átomos”.
“Estes átomos são qualitativamente invariáveis, impenetráveis, indivisíveis, estão em constante movimento, diferem uns dos outros pela forma, posições e ordem de ligações entre si. E é associando-se uns aos outros que formam todos os corpos. Demócrito lutava contra o idealismo e a religião, demonstrando que tudo era constituído por átomos e que até a alma era formada por átomos ‘finos’ e ‘tenros’” [11].
As mudanças na natureza eram consideradas apenas como variante do movimento mecânico. A doutrina da matéria não estava em condições de ser aplicada no estudo da vida social. A matéria era identificada com a natureza e, por isso os materialistas antigos não eram capazes de encontrar a base material da vida social e da história da sociedade humana.
“O materialismo apareceu há uns dois mil e quinhentos anos na China, na índia e na Grécia. A filosofia nestes países, estava em estreita relação com a experiência diária dos homens e com o gérmen de um conhecimento da natureza. Mas aquele tempo a ciência acabava de nascer, pelo que as noções dos antigos filósofos materialistas sobre o mundo e a matéria, se bem que contivessem rasgos de génio, careciam de base científica e eram ainda muito primitivas”[12].
Neste conceito de matéria foram introduzidas significativas alterações, o que resultou numa importante ampliação do conceito da matéria “a matéria não é apenas a natureza mas também a base da vida social”[13].
Os materialistas dos séculos XVII e XVIII, encaravam a matéria no seu conjunto como algo imutável, eternamente submetido a um mesmo fenómeno de rotação. Ao mesmo tempo, não se apercebiam da base material da vida social ensinavam que a transição para formas sociais mais perfeitos, era devida ao progresso da ciência.
Um passo significante na evolução do conceito da matéria no século XIX foi dado pelo alemão Feuerbach e por alguns filósofos russos. Mas a doutrina de Feuerbach achava-se até certo ponto, divorciada da prática político-social.
Um grande progresso dos materialistas russos consistiu em considerarem a filosofia não só como a doutrina do que existe, da matéria mas também como a de que o que existe, a matéria, pode ser transformada para o bem de todos, do povo. O grande promotor desta filosofia é o próprio Marx, como já nos referimos, na sua obra Teses sobre Feuerbach: “ Os Filósofos, até aqui, limitaram-se a interpretar o mundo, mas a verdadeira tarefa é transformá-lo”[14]. Esta tese é fruto da gnosiologia que podemos ler em Marx e constitui uma maneira de fazer filosofia não mais na sua vertente ontológica, cosmológica, antropológica e teológica, mas, como que tornar a filosofia como uma política (apenas) e não simplesmente encará-la também com esta tarefa e missão a que hoje chamamos de Filosofia Política.
O materialismo dos pensadores como Marx é o materialismo dialéctico e histórico. Podemos considerar que este materialismo é produto de uma longa evolução do pensamento humano. E o terreno em que existiu também já se considerava preparado.
Partindo do ponto mais alto do pensamento social e científico da sua época, Marx em colaboração com Engels ao apoderarem-se de quanto de válido a filosofia tinha produzido, constroem uma nova doutrina sobre a matéria, isenta dos defeitos de que padecia as anteriores doutrinas. 
Esta doutrina que surge como resultado da viragem revolucionária realizada pelos seus criadores, difere radicalmente de todas as concepções filosóficas anteriores e actuais pelo facto de, pela primeira vez, a concepção do mundo materialista ter sido aplicada consequentemente em todas as esferas fundamentais do conhecimento e da existência humana. E aqui radica, simultaneamente, a sua virtude e os seus defeitos.
Importa referir que a descoberta da matéria da vida social permitiu fundamentar, revelar e desenvolver num nível qualitativo novo, as teses manifestadas por pensadores antigos sob a forma de conjunturas a respeito da variedade das formas da matéria. Marx “demonstrou que a matéria existe não só sob a forma de elementos ou processos naturais mas, também, sob a forma de actividade social e das relações sociais que não podem ser reduzidas a nenhum elemento material. Isto significa, por sua vez, que a mais importante característica da matéria é o seu carácter objectivo, é sua existência fora da consciência humana e independente dela”[15].
Em toda sua história secular, a filosofia materialista aliou ao conceito de matéria o conceito de movimento. A diversidade da matéria corresponde a diversidade de formas do seu movimento.
As principais formas do movimento da matéria são: “Física (que inclui também, o movimento mecânico), química, biológica e social”[16].
Nem a natureza nem a sociedade conhecem um estado de imobilidade absoluta, de repouso em que nada mude. O movimento, a mudança, o desenvolvimento, constituem como que uma propriedade eterna e irrevogável da matéria. O movimento encarado como forma de existência da matéria abrange todos os processos e mudanças que se operam no universo.
As formas do movimento da matéria mencionados, segundo a ordem em que foram enumeradas, constituem etapas ou graus de desenvolvimento da matéria, que é infinita no espaço e no tempo.
“Entre todas formas do movimento da matéria, podemos considerar como inferior a forma física que consiste, em conformidade com os dados da ciência moderna, na deslocação dos corpos no espaço e a sua interacção (partículas elementares, átomos corpóreos, corpos celestes e os seus sistemas) e dos campos (electromagnéticos, gravitacionais, etc.). A forma química do movimento da matéria, e o movimento e a interacção dos átomos e moléculas, a formação das suas combinações e das novas propriedades químicas das substâncias. A forma biológica do movimento da matéria é o metabolismo orgânico a formação de corpos albuminosos compostos pelas moléculas, a estrutura e a vitalidade das células, a sua divisão, transmissão de caracteres hereditários, processos vitais dos organismos, isto é, o reflexo, a auto-regulação, o comando e a interacção. E por fim, a forma social do movimento da matéria é actividade laboral, social e de produção como matéria da vida social e todas as relações sociais – entre os indivíduos, dentro das famílias, entre classes, etc.”[17]   
Podemos dizer, que estas formas do movimento da matéria não existem cada uma por si, isoladas uma das outras, mas antes se encontram sob acção de relações recíprocas, estão interligadas e constituem no seu conjunto a matéria que nós observamos. Estas formas surgem consequentemente, no processo de desenvolvimento da matéria de formas inferiores para formas superiores.
Chamando maior atenção para a forma social do movimento da matéria, podemos dizer que esta exerce uma enorme e sempre crescente influência sobre a natureza. No processo de desenvolvimento histórico, a humanidade introduz na sua actividade social e na produção cada vez mais processos materiais, transforma-os radicalmente e cria materiais novos.
O pensamento humano, atravessou um caminho longo, e difícil, antes de alcançar, compreender por sua própria natureza, realçar as suas particularidades importantes.
O tema da consciência na história da filosofia foi sempre alvo da atenção dos investigadores pois está relacionado com a solução da questão fundamental desta ciência.
Os filósofos da Grécia antiga partilham do princípio de que a consciência, a que chamavam alma, era algo diferente dos fenómenos que se verificavam na natureza. Platão foi o primeiro da história da filosofia a falar da consciência como ideal e do seu carácter imaterial. Ele foi também o primeiro a indicar que o pensamento é constituído por ideias. Ele elevou tanto este aspecto da consciência para a categoria do absoluto que chegou a considerar as ideias como algo primário em relação a todo o mundo material.
O pensamento material, influenciado pela religião e pela Igreja, considerava a consciência, a que chamava na maioria das vezes alma, a ‘centelha ardente’ e o ‘reflexo’ do intelecto divino, como por exemplo em S. Agostinho.
“Os materialistas franceses do século XVIII, deram um grande contributo para a interacção filosófica da consciência. Eles demonstraram de forma convincente, nos limites das possibilidades científicas da sua época, que a consciência é o reflexo do mundo material objectivo. De acordo com os seus conceitos, o pensamento humano, as noções e as imagens são marcos peculiares dos objectos materiais, coisas e processos que existem objectivamente” [18].
O importante passo no estudo da consciência foi dado pelos materialistas russos do século XIX. Eles consideravam que a consciência é secundária em relação a matéria e viam nela o mais alto grau de desenvolvimento da natureza.
Fazendo uma análise crítica da problemática da consciência ao longo da história da filosofia, podemos dizer que apesar do seu elevado mérito, a teoria, sobre a consciência dos materialistas da época pré-marxista tinha defeitos. Deve-se mencionar, em primeiro lugar, a sua capacidade de explicar a origem da consciência. O que os antigos materialistas fizeram é constatar o facto de que a consciência é uma capacidade exclusiva do homem, que o distingue do animal.
A elevação da consciência a categoria do absoluto, ocupou um lugar especialmente importante na doutrina dos filósofos alemães, Fichte e Hegel. Estes filósofos ressaltaram o aspecto activo da consciência humana, chagando a ponto de desenvolvê-lo de tal forma que a consciência era considerada primária, a fonte de todo o existente, a base primordial do mundo.   
O mistério da consciência, a sua origem, essência e carácter social foram sempre alvo da atenção dos cientistas, filósofos e pensadores mais destacados. Durante muitos séculos foram realizados muitos estudos sobre a consciência, a partir dos quais se elaboraram sistematizações importantes.

a)                  Origem da consciência
“De acordo com Marx, Engels e Lenine, o aparecimento da consciência foi condicionada por duas premissas básicas; pelas naturais e pelas sociais”[19].
As premissas naturais do aparecimento da consciência foram analisadas na teoria do reflexo. Lenine, utilizando as descobertas do materialismo antigo que considerava que a consciência é um reflexo, demonstrou que o conceito de reflexo é muito mais amplo do que o conceito de consciência e que este último representa um grau mais alto do desenvolvimento do primeiro.
O reflexo pode ser definido como sendo “a propriedade geral da matéria que consiste em reproduzir e fixar aquilo que é inerente ao objecto reflectido. Pode ainda ser definido como a capacidade dos corpos de reflectir no seu estado interno as propriedades dos outros corpos que os influenciam”[20].
As premissas sociais do aparecimento da consciência foram apresentadas com base no trabalho humano: “o mais importante factor do aparecimento e desenvolvimento da consciência é a colectividade de trabalho”[21]. Para transformar a maioria dos objectos da natureza são necessárias simultaneamente numerosas operações e acções.

b)                 A Essência da consciência
“A consciência pode ser definida como uma categoria filosófica que designa a forma suprema ideal do reflexo do mundo surgida com base no trabalho”[22].
Os filósofos idealistas elevam a consciência à categoria do absoluto apresentam-na como algo totalmente contrário à matéria, que existe fora e antes dela e que constitui a base de todo mundo material.
A consciência, como propriedade do cérebro, pertence à matéria, e as tentativas empreendidas neste plano de contrapô-las não têm sentido. Mas a consciência, como o reflexo do pensamento em formas ideais, é contrária à matéria e difere dela. Ao mesmo tempo, também sob este ponto de vista consciência não pode ser considerada como algo que não depende absolutamente da matéria, pois a sua essência consiste no reflexo do mundo material, e o seu conteúdo é condicionado por este mundo.

c)                  Carácter social da consciência
No decorrer de toda vida a história da filosofia, o materialismo combateu o idealismo objectivo que procurava apresentar a consciência como algo que fora extraído da cabeça humana e que existia fora do homem. Mas a consciência personificada pelo intelecto absoluto, teria criado tudo o que existe incluindo o homem.
“O carácter social da consciência deve-se em primeiro lugar à sua origem histórica. Ela surgiu como resultado ou fruto do trabalho social. Em segundo lugar, a consciência de cada indivíduo forma-se sob a influência da sociedade. Os pais, a família e o meio ambiente formam através da língua e de numerosas acções a consciência, a auto-consciência e as emoções humanas da criança. Ela desenvolve-se em cada pessoa graças ao contacto com outros homens e à manipulação dos objectos criados pelo trabalho humano. Uma pessoa destruída de todos os contactos e isolada durante muito tempo do convívio humano, começa a perder gradualmente as qualidades humanas e a sua consciência acaba por extinguir”[23].

3.3.            O Materialismo Histórico

O materialismo histórico tem a sua matéria de investigação e esforça-se por desdobrar as leis do objecto estudado por ele, isto é, a sociedade, por isso é considerado ciência.
“Pode ser definido como a ciência sociológico - filosófica sobre as leis mais gerais e as suas forças motrizes do desenvolvimento da sociedade”[24].
O materialismo histórico surgiu nos anos 40 no século XIX, podemos considerar o seu aparecimento não causal naquela altura. A classe operária, que dera início a sua luta revolucionária independente, necessitava da compreensão correcta das leis positivas do desenvolvimento social e de uma verdadeira ciência sobre a sociedade.  
O seu aparecimento se deve a Karl Marx e Friedrick Engels que vendo a situação da classe operária da sua época, tentaram explicar como a evolução da sociedade e, em particular, as criações do espírito humano no campo da política, da moral e do direito eram determinadas ou condicionadas, em última instância, pelas relações económicas de produção, de distribuição e circulação dos bens de subsistência.
“Qualquer ciência da sociedade se esforça por responde à questão sobre a essência, a natureza do objecto por ela estudado. Mas a sociedade é algo que forma um todo, tudo nela está ligado. Por isso esclarecer, por exemplo, o que é a língua, e qual a sua origem, só é possível quando soubermos o que é aquele todo, parte do qual é constituído pela língua. Mas nem a linguística, nem outra ciência social particular, podem esclarecer a questão da essência e do aparecimento da sociedade. Isso só pode fazer o materialismo histórico, que estuda a sociedade como um todo”[25].
O materialismo histórico encara a sociedade de um ponto de vista materialista, como produto de interacção dos homens, existindo e desenvolvendo-se pelas suas próprias leis. O materialismo histórico, fornece a base teórica geral para as investigações sociais concretas, as quais assumem um grande significado no socialismo em ligação com os problemas da condução dos processos sociais, do seu propósito e planificação.
“O aparecimento do materialismo histórico provocou também uma revolução que consiste na mudança de uma compreensão não científica, materialista”[26].
O materialismo histórico não é um estudo absoluto e definitivo da sociedade. Ele pretende conhecer somente as leis gerais da sociedade, para poder dar ao conhecimento científico princípios iniciais de análise. 
Desde tempos muito remotos os homens tentaram definir o que determina o regime social e como se desenvolve a história humana. Nisto descobriram que o trabalho era a base da sociedade humana.
No pensar e no dizer de uma das vozes autorizadas da Igreja católica angolana ou em Angola o trabalho embora seja sacrificador constitui essencialmente como que a mola propulsiva do progresso humano e do desenvolvimento cósmico: “É falsa e perniciosa a ideia de que o sucesso não nasce do trabalho. Não há verdadeiro sucesso, em qualquer campo da actividade humana, sem esforço do trabalho (mental) ou (braçal). Ninguém consegue êxito sem luta, sem sacrifício, sem desgaste e sem suor do próprio rosto. Ninguém colhe, se primeiro não semeou”. (NAMOLO, Gerardo; HATWIKULIPI, pseudónimo literário, com um fundo antropológico, filosófico e teológico actual e actuante).
A sociedade é um sistema excepcionalmente complexo e multifacetado que engloba numerosos elementos, tendências, propriedades, orientações e aspectos que podem ser grandes ou pequenos, simples ou complexos, conhecidos ou desconhecidos, relativamente estáveis ou em permanente transformação, materiais ou espirituais. Todos eles se modificam e progridem no plano histórico e exercem uns sobre os outros uma influência complexa, portanto também varia.
Uma análise profunda e geral da vida social fez Marx ao chegar a conclusão de que ela tinha como base o trabalho humano. Marx, porém, diz que “o trabalho não é senão o processo que se concretiza entre o homem e a natureza, o processo no qual o homem, com a sua actividade, materializa, regula e controla a troca de substâncias entre si e a natureza. Com força da natureza, ele contrapõe-se a substância da natureza”[27].
“O traço característico do trabalho humano consiste em que ele tem a forma da actividade que regula as forças na natureza. No processo do trabalho o homem altera simultaneamente a natureza externa e a sua  própria natureza, forma e aperfeiçoa as suas qualidades humanas. O próprio homem e toda a sociedade humana desenvolvem precisamente com base no trabalho”[28].
Em vista da importância fundamental do trabalho, pode se afirmar que “a sociedade é um sistema material, cujo ser tem como base o intercâmbio de matérias e de energia entre si e a natureza através do trabalho”[29].
Durante um período histórico longo, a milhões de anos, muitas gerações dos antepassados do homem aprenderam gradualmente a fabricar instrumentos de trabalho, elaborando ao mesmo tempo, a sua capacidade de reflectir os aspectos essenciais dos objectos e as leis da sua existência. Foi neste período que se formou a consciência.
Com o trabalho surgiu o contacto entre os homens e uma forma especial deste contracto, a fala humana. Para transformar a maioria dos objectos da natureza era preciso executar em conjunto, em grande número de operações diferentes, uma vez que uma pessoa não podia fazer devido o carácter limitado das suas capacidades.
O trabalho uniu-os em colectividades, no âmbito das quais se realizou a divisão das operações laborais. Assim, no processo de trabalho formou-se a sociedade humana como condição primordial e meio de existência dos homens.
Este processo de trabalho colectivo fez surgir também a fala humana, que os homens utilizam para trocar informações e coordenar as suas acções.
“As mais importantes qualidades humanas – o trabalho, a consciência e a fala surgem no mesmo período histórico e influenciam-se mutuamente. Mas a causa primordial é a mais profunda de todo o humano é precisamente o trabalho. Eis porque a sociedade pode ser definida como um sistema material, cuja essência e a base é o trabalho devidamente orientado e iluminado pela consciência”[30].
A vida material da sociedade inclui, em primeiro lugar, o trabalho dos homens dado que estes produzem os objectos e bens necessários para a sua substância: alimentos, vestuário e habitação. O trabalho é uma necessidade natural eterna, condição indispensável para que a sociedade possa existir.
A produção não é obra do homem isolado, tem sempre um carácter social. No processo de produção de bens materiais, os homens quer o queiram quer não, relacionam-se, de uma maneira ou de outra, e o trabalho de cada condutor converte-se numa particularidade do trabalho social.
“Estas relações que os homens estabelecem no decurso da produção de bens materiais foram denominadas por Marx de relações de produção”[31].
O carácter destas relações de produção é determinado pelo nível de desenvolvimento e carácter das forças, produtivas.
No processo da produção não só são criados produtos materiais necessários à existência dos homens como também se estabelecem determinadas relações sociais entre eles. No trabalho colectivo os homens entram em interacção, por um lado, com a natureza e por outro uns com os outros; relações estas que são aspectos indissoluvelmente ligados e elementos integrantes de qualquer actividade de produção concreta.
“As forças produtivas são os elementos da produção, por intermédio dos quais a sociedade influencia a natureza e a transforma de acordo com os seus propósitos. O carácter desta influência manifesta-se no modo de produção”[32].
Para realizar a produção, não basta ter apenas os meios de trabalho, ou só os objectos de trabalho. É necessário além disso, que esses dois componentes se unam, e que tomados em conjunto designam-se meios de produção. Estes constituem, porém, o mais importante componente das forças produtivas da sociedade.
Os homens, ao agirem sobre a natureza, modificam-na e ao mesmo tempo de modificam também: “acumulam a experiência de produção, hábitos de trabalhos e conhecimentos sobre o mundo que os rodeia. Tudo isto lhes permite modernizar os instrumentos de trabalho e modo de utilização dos mesmo, inventar instrumentos novos e aperfeiçoar de uma maneira ou de outra o processo de produção. Cada um desses aperfeiçoamentos ou invenções traz consigo novos melhoramentos, por vezes, dá lugar a uma verdadeira revolução na técnica e na produtividade do trabalho”[33].
A vida da sociedade, a partir daí, depende ou tem como base a produção dos bens materiais.
Quando se destacaram as relações de produção, como base de qualquer sociedade e se revelaram as diferenças qualitativas entre elas tornou-se possível reduzir um sem número de organismos sociais a alguns tipos básicos denominados ‘formações económico-sociais’.
O carácter das forças produtivas e o nível do seu desenvolvimento determinam as relações que os homens estabelecem entre si no processo de produção. E essas relações constituem como que a base sobre o qual ergue, por sua vez, determinada supra-estrutura política e ideológica. Cada sociedade é pois um organismo completo, aquilo a que se dá o nome de formação económico-social, isto é, um determinado tipo histórico de sociedade com o seu modo de produção, a sua supra-estrutura.
O conceito de formação económico-social, “permite-nos compreender a razão por que, apesar da imensa variedade de pormenores concretos, a totalidade dos povos percorre, em linhas gerais, o mesmo caminho. É que, em última análise, a história de cada um deles é condicionada pelo desenvolvimento das forças produtivas, desenvolvimento esse que se subordina às mesmas leis internas. A sociedade progride através de uma sucessão consecutiva e subordinada a leis, das formações económico-sociais; e o povo que vive no contexto de uma formação mais avançada mostra o futuro aos restantes povos, do mesmo modo que, nesses povos, vê o seu próprio passado”[34].
A noção de formação económico-social permite unir e comparar diversos países que se encontram na fase idêntica de desenvolvimento da produção material e revelar o elemento comum que neles existe.
O materialismo histórico não impõe à história esquemas preconcebidos, nem tenta adaptar às suas conclusões os acontecimentos do passado e do presente. A conclusão de que a história da humanidade é uma sucessão consecutiva de formações económico-sociais; comunidade primitiva, esclavagista, feudalista, capitalista e socialista.
O que quero mostrar neste tema são as características principais das forças produtivas e das relações de produção nessas formações. Tentarei referir-me logo em seguida aos aspectos mais gerais das formações económico-sociais e prescindindo dos pormenores e traços específicos secundários que tão abundantes se apresentam na história de cada época.

a)                  Comunidade Primitiva
O regime da comunidade primitiva é, historicamente, a primeira forma que a sociedade adoptou depois de o homem ter adquirido, através de um longo processo de trabalho, as qualidades que o diferenciam dos restantes seres vivos.
As forças produtivas daquela época eram muito fracas e a produção da sociedade não bastava para a subsistência dos homens. Os meios de trabalho eram propriedade da comunidade. A distribuição dos produtos fazia-se numa base equitativa. As relações entre os homens tinham como base a ajuda mútua e o colectivismo. Ao analisar o processo histórico de formação da sociedade humana, Engels distinguiu três períodos principais: “Selvajaria, barbárie e civilização”[35]. 
Na época da selvajaria, os homens utilizavam sobretudo objectos da natureza prontos para satisfazer as suas necessidades vitais. Os instrumentos de trabalho criados artificialmente pelo homem, (o cacete, o machado de pedra, a faca e a ponta de lança do mesmo material), eram apenas um meio auxiliar, que o ajudava a apropriar-se desses objectos.
No período da barbárie os homens começaram a dedicar-se à pecuária e à agricultura e passaram da simples colheita dos objectos da natureza para o fabrico dos produtos necessários para a satisfação das suas necessidades. Os instrumentos de trabalho passaram a desempenhar o papel principal na manutenção do homem. Esta revolução alterou radicalmente toda a vida da sociedade, uma vez que a pecuária e a agricultura passaram a constituir a base da economia, estabeleceu-se o modo de vida sedentário, começaram a formar-se as povoações, a utilizar amplamente instrumentos metálicos, verificou-se a rápida elevação da produtividade do trabalho e a multiplicação das riquezas sociais. Começaram a surgir excessos de produtos que podiam ser trocados.
O crescimento da produtividade do trabalho fez com que a vida em família se tornasse mais vantajosa. O clã dividiu-se em famílias. Surgiu a propriedade privada e a família tornou-se proprietária dos meios de produção. O aparecimento da propriedade privada provocou a divisão da sociedade em classes. Assim a humanidade passou da barbárie para a civilização.

b)                 Comunidade esclavagista
As forças produtivas da sociedade, ao aumentarem exigem novas relações de produção entre os homens. Assim sendo, aparece o regime esclavagista, onde a base das relações de produção é a propriedade privada do esclavagista.
Aqui as forças produtivas herdadas da formação primitiva continuavam a desenvolver-se rapidamente. Os instrumentos de pedra e de madeira cederam lugar aos instrumentos metálicos. A par do cultivo dos cereais surgiram a horticultura e a fruticultura. Deu-se início à construção de obras artificiais para a irrigação das terras e de moinhos para a transformação dos cereais. Surgem a exploração de minerais, a construção civil, o fabrico de apetrechos de guerra, as construções navais e desenvolve-se o artesanato.
Ao princípio, as relações de produção esclavagistas contribuíram para o desenvolvimento das forças produtivas, mas com o tempo elas começaram a entravar a produção social. O ritmo de desenvolvimento da maquinaria e da produção em geral tornava-se cada vez mais lento; os escravos que eram a força produtiva básica da sociedade, degradavam física o intelectualmente.
À medida que a produção se desenvolvia, a contradição entre as forças produtivas e as relações da produção sociedade esclavagista ia-se agravando. Este conflito deu origem a numerosas insurreições de escravos. Estas insurreições levaram ao desmoronamento da comunidade esclavagista que cedeu lugar a uma nova formação, a feudal.

c)                  Comunidade feudal
A base das relações de produção deste regime é a propriedade dos senhores sobre os meios de produção e, em primeiro lugar da terra.
As relações entre o senhor feudal e o servo estavam organizadas de tal maneira, que este último recebia uma determinada parcela dos resultados do seu trabalho, o que estimulava o seu interesse no aumento do rendimento do seu trabalho. Esta característica das relações de produção vem abrir novas possibilidade ao crescimento das forças produtivas.
“As descobertas feitas no feudalismo iriam deixar uma profunda marca na história: os homens aprendem a tornar maleável o ferro fundido, a construir barcos à vela próprios para longos viagens, a fabricar aparelhos ópticos simples (óculos, binóculos de longo alcance); inventaram a bússola, a pólvora, o papel a imprensa e o relógio de corda. À energia muscular do homem e dos animais vai-se juntando cada vez mais a energia do vento (moinho, barco à vela) e das quedas de água”[36].   

d)                 Comunidade capitalista
A base das relações do capitalismo é a propriedade privada dos meios de produção pela classe dominante.
A oficina artesanal e a manufactura cedem lugar a enormes empresas industriais e minas. A procura do lucro é um poderoso estímulo para a ampliação da produção, para o aperfeiçoamento da maquinaria e para o melhoramento da tecnologia na indústria e na agricultura.
As classes fundamentais da sociedade são agora constituídas por capitalistas e pelos operários. As relações entre elas continuam a ser antagónicas, dado que se baseiam na exploração e opressão sobre os que nada têm por parte dos poderosos.
Como regra geral: “o capitalismo não precisa da força para obrigar alguém a trabalhar seu benefício. O operário, privado dos meios de produção, vê-se reduzido a fazê-lo ‘voluntariamente’ sob ameaça da morte pela fome. As relações de exploração estão agora ocultas pela ‘livre’ contratação dos operários por parte dos patrões, pela ‘livre’ compra-e-venda da força de trabalho”[37].
Tal como sucedeu noutros tempos, a passagem ao novo modo de produção só é possível através da revolução social. A classe operária congrega, ao seu redor, todos os trabalhadores, derruba o domínio do capital e cria o novo regime, socialista, onde não existe a exploração do homem pelo homem. Este regime, liquida as relações de produção do capitalismo e abre uma nova página na história da humanidade.

e)                  Comunidade socialista
A base do modo de produção socialista é a propriedade social dos meios de produção. As relações de produção aqui são de colaboração e ajuda recíproca entre os trabalhadores livres da exploração.
No socialismo conserva-se apenas a propriedade individual ou a pequena propriedade privada sobre os meios de produção e objectos de consumo que não podem constituir uma fonte de exploração. Neste regime rege o princípio “quem não trabalha não come”[38].
As relações de produção socialistas correspondem ao carácter e ao nível das forças produtivas modernas e aperfeiçoam-se permanentemente. Os seus traços característicos são as forças produtivas altamente desenvolvidas, uma indústria poderosa e altamente evoluída, grandes fazendas mecanizadas e baseadas nos princípios colectivistas.
São estas, nos seus traços mais gerais, as principais etapas que a humanidade percorreu já. 
Tudo quanto conhecemos do passado constitui uma confirmação evidente e viva da veracidade científica da interpretação materialista da história, cuja essência foi formulada por Marx, no seu prefácio à contribuição à crítica da economia política, deste modo: Na produção social da sua vida, os homens entram em relações determinadas, necessárias e independentes da sua vontade, as relações de produção, que correspondem a um determinado grau de desenvolvimento das suas forças materiais de produção. O conjunto destas relações de produção constitui a estrutura económica da sociedade, a base real sobre a qual se ergue a supra-estrutura jurídica e política, a que correspondem determinadas formas de consciência social. O modo de produção da vida material condiciona os processos sociais, político e espiritual, da vida em geral. Não é a consciência dos homens que determina a sua consciência, digo o seu ser mas, pelo contrário, é o seu ser social que determina a sua consciência. Alcançado um determinado grau no seu desenvolvimento, as forças produtivas materiais da sociedade entram em contradição com as relações produtivas existentes ou com as relações de propriedade no âmbito das quais se desenvolvem até aí. Essas relações, que anteriormente eram formas de desenvolvimento das forças produtivas transformam-se num travão e num estorvo, e é então que se inicia a época da revolução social. A modificação da base económica origina, com maior ou menor rapidez, a transformação de toda a enorme supra-estrutura.
O desenvolvimento da sociedade é um processo sujeito a leis e subordinado a uma determinada necessidade histórica que não depende da vontade ou consciência dos homens. Conhecer essa necessidade, determinar quais as leis que regulam marcha da história e o modo como actuam, é a mais importante finalidade da ciência social, a premissa necessária para que as leis objectivas possam ser utilizadas em proveito da sociedade.
O materialismo, que considera o processo histórico como algo sujeito a leis, opõem-se não só às noções subjectivistas que consideravam a história como um aglomerado de factos causais, mas também ao fatalismo que nega totalmente o valor da actividade consciente dos homens, da sua capacidade para influir no curso do desenvolvimento social.
“O fatalismo é organicamente estranho à concepção materialista da história, dado que as leis segundo as quais se desenvolve a sociedade não actuam automaticamente, por si próprias. Sendo o produto da actividade dos homens, essas leis determinam, por sua vez, a orientação geral da actividade humana. Sem os homens e fora da sua acção, as leis sociais não existem nem podem existir”[39].
O desenvolvimento de todas as formações económico-sociais anterior ao socialismo decorreu de tal modo que as leis objectivas actuavam elementarmente, como uma necessidade cega que ia abrindo caminho por entre as acções casuais e dispersas dos indivíduos. As leis objectivas imperavam sobre os homens e eram concebidas como uma força estranha e incompreensível, à qual eram obrigados a submeter-se.
“Tal não se deve, como é óbvio, a simples circunstância de os homens não conhecerem as leis sociais. A causa principal dessa espontaneidade do desenvolvimento social reside em que a produção material, o factor de maior importância dentro da vida da comunidade, permanecia fora do controle dos homens. A propriedade privada dos instrumentos e meios de produção não permite imprimir conscientemente uma direcção ao desenvolvimento da sociedade no seu conjunto”[40].
Na época do socialismo, graças à propriedade social dos meios de produção, os homens colocam sob o seu controle a produção da sociedade no seu conjunto.
A concentração nas mãos da sociedade socialista dos meios fundamentais de produção permite planificar a economia o que por sua vez, assegura um rápido ritmo de crescimento.  
“O facto de os homens utilizarem conscientemente as leis sociais não significa que estas percam o seu carácter objectivo; a sociedade pode assim orientar-se livremente na situação e, tendo presente as condições objectivas, dirigir-se segundo os seus planos para as finalidades propostas, finalidades estas que são fixadas em conformidade em as citadas leis”[41].
As consequências sociais da utilização consciente das leis são de primordial importância. “Em primeiro lugar, os homens deixam de ser escravos das leis; possuindo, como é o caso, uma teoria científica, podem prever e preparar-se de antemão para esta ou aquela acção das leis, encaminhá-la no sentido que lhes convém, etc. Numa palavra, os homens transformam-se em senhores das suas próprias relações e das leis que as regulam. Em consequência disso, vai-se tornando mais importante, no progresso da sociedade, o papel da consciência social e da supra-estrutura no seu conjunto. Em segundo lugar, o conhecimento das leis objectivas perante discernir claramente o objectivo final do movimento, tal como é determinado por todo o curso do desenvolvimento social. É evidente que, conhece-se o objectivo a alcançar, é possível chegar até ele por um caminho mais directo, poupando esforços e meios. Em terceiro lugar, a consciência entre a linha objectiva de desenvolvimento e os interesses, aspirações e desejos, da maioria da sociedade, multiplica o entusiasmo, a energia e a tenacidade das massas para a conquista de fim proposto, o que acelera o avanço da sociedade”[42].


[1] Cfr. Logos – Enciclopédia luso brasileira de filosofia, materialismo, na voz de Manuel da Costa Freitas, 3.º Vol., Edit. Verbo, Lisboa/S. Paulo, 1991, Col.729.

[2] Cfr. HAHN, Erich; KOSING, Alfred, A filosofia marxista-leninista, edições Avante!, Lisboa, 1983, P. 23
[3] Cfr. MOURISCA, Francisco da Mata, socialismo cientifico e cristãos comunistas, mutinova, Lisboa, 1979, P. 09.  
[4] Cfr. REALE, Giovanni; ANTISERI, Dario, História da Filodofia, do renascimento até aos nossos dias, 3º Vol., Ediç. Paulinas, S. Paulo, 1991, P. 194.
[5] Cfr. AA. VV., Que é o materialismo histórico, Ediç. Progresso, Moscovo, 1985, pág. 07.
[6] Cfr. REALE, Giovanni; ANTISERI, Dario, Op. Cit., P. 195.
[7] Cfr. KOVALHOV, S. M., Materialismo dialéctico e histórico, novo curso editore, Amadora, 1975, P. 47.
[8] Cfr. RIBEIRO, Bonifácio; Silva, José da, Compêndio da Filosofia, livraria popular, Lisboa, 1971, P. 86.
[9] Cfr. HARN, Erich; KOSING, Alfred, Op. Cit., P. 229.
[10] Cfr. KOVALHOV, S. M., Op. Cit., P. 44
[11] Cfr. BURLATSKI, F., Fundamentos da filosofia marxista-leninista, Edições progresso, Moscovo, 1987, P. 27.   
[12]Cfr. KUUSINEM, Otto V., Manual de marxismo-leninismo, novo curso editores, 1º Vol., Amadora, 1975, P.21. 
[13] Cfr. BURLATSKI, F., Op. Cit., P. 32.
[14] MARX, K. Teses Sobre Feuerbach
[15] Cfr. Ibidem, P. 33.
[16] Cfr. Ibidem, P. 46.
[17] Cfr. Ibidem, P. 47.
[18] Cfr. Ibidem, P. 54.
[19] Cfr. Ibidem, P. 55.
[20] Cfr. Ibidem.
[21] Cfr. Ibidem, P. 58.
[22] Cfr. Ibidem, P. 59.
[23] Cfr. Ibidem, P. 68.
[24] Cfr. AA.VV; que é o materialismo histórico?, Edição Progresso, Moscovo, 1985. P. 09.
[25] Cfr.  KOVALHOV, S.M., Op. Cit., P. 178.
[26] Cfr. Ibidem, P. 180.
[27] Cfr. MARX, Karl; Engels, Friedrick, Obras escolhidas, T. 23, Moscovo, 1955, P. 188, citado por BURLATSKI, F., Op. Cit., P. 148.
[28] Cfr. BURLATSKI, F., Op. Cit., P. 148.
[29] Cfr. Ibidem.
[30] Cfr. Ibidem, P. 150.
[31] Cfr. KUUSINEM, Otto V., Op. Cit., P. 132.
[32] Cfr. BURLATSKI, F., Op. Cit., P. 155.
[33] Cfr. KUUSINEM, Otto V., Op. Cit., P. 133.
[34] Cfr. Ibidem, P. 137.
[35] Cfr. MARX, Karl; Engels, Friedrick, Obras escolhidas, T. 03, Moscovo, 1955, P. 228, citado por BURLATSKI, F., Op. Cit., P. 178.

[36] Cfr. KUUSINEM, Otto V., Op. Cit., P. 143.
[37] Cfr. Ibidem, P. 146.
[38] Cfr. BURLATSKI, F., Op. Cit., P. 182.
[39]  Cfr. KUUSINEM, Otto V., Op. Cit., P. 148.
[40]Cfr. Ibidem, P. 148.
[41] Cfr. Ibidem, P. 154.
[42] Cfr. Ibidem, P. 154-155.

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