quinta-feira, 5 de maio de 2011

UMA FILOSOFIA e UMA POLÍTICA DE TRANSFORMAÇÃO SOCIAL

 (e Económica) E  OS DESAFIOS PARA A IMPLEMENTAÇÃO DOS DIREITOS (Sobretudo) DA PESSOA HUMANA EM PROL DA ORDEM CÓSMICA

Ponto de Situação:  A Busca de Fundamentos da  Antropologia  Cristã.
 O que Pretende,  finalmente, é: Desenvolvimento de um Projecto de Investigação e Acção Pastoral que não perde de Vista o Princípio de Desestruturar as Estruturas da Morte e a Própria Morte  Assumindo CRISTO (Cfr sobretudo os quatro Evangelhos  do Cânone Bíblico Católico)  como Última, Fundante, Fontal, Fundamental … Resposta aos anseios, esperanças, buscas, desafios, alegrias e tristezas do Homem e da Mulher do Tempo de Ontem, de Hoje e de Amanhã…[1] – Desafios de Uma Pastoral Libertadora e Purificação da Teologia da Libertação  para a Eficaz  Relação e Coordenação do social e do religioso no Contexto da Evangelização em África.[2]
“A Igreja vê na Transfiguração de Jesus o próprio caminho de transformação da existência humana. Para o cristão, é sinal e apelo da transformação baptismal: um convite a dar nova figura, novo rosto, nova beleza à vida com Cristo que nos é comunicada no Baptismo”.[3]

4.1.            Exigências de Re – Humanização                                             

Desde já devemos propor aqui que em questões sociais e políticas até mesmo antropológicas, é bom dizê-lo, a distinção entre pensamento de Marx e pensamento Marxista é pertinente e não apenas por questões de metodologia mas de compreensão . A antropologia política de Marx, pode ser considerada como diferente dos seus predecessores e de muitos dos seus contemporâneos e muitos dos seus seguidores. Também é preciso notar a complexidade prolixa da obra do próprio Marx, por causa do materialismo contra o idealismo, do ateísmo contra a alienação religiosa e do colectivismo contra o liberalismo económico e o subsequente capitalismo, isto tudo apesar do seu antropocentrismo. Às vezes nos damos conta que a Antropologia política de Marx é desprovida de um quid ontológico, pela subestimação da metafísica e da preocupação economicista socialista. Em todo caso e por causa de tudo isto, desta procura de sentido da humanidade que no fundo é o próprio homem – o ser humano, a pessoa humana na sua individualidade, na sua existência e no sentido do seu viver e da sua vida integral – que está em causa, hoje como hoje, neste tempo em que a humanidade se depara com a procura do sentido de tudo e de todos, o que leva a experimentar e talvez a permitir tudo, a nossa proposta é repropor Marx não como solução, naturalmente,  mas como uma etapa e um indivíduo/pensador a não depositar e conservar (apenas), e por vezes a visitar como um “objecto” inesquecível, mas pessoa a pouco lembrar, no museu da história do pensamento humano e da humanidade.
Propomos ainda Marx, pelos seguintes itens:
- Existe uma grande dificuldade em distinguir nos escritos de Marx o homem de acção, o profeta e o sociólogo e, por outro, as leituras várias do seu pensamento se terem transformado em doutrinas oficiais cuja ortodoxia foi durante anos, severamente protegida[4]. 
- Marx, pode se caracterizar como um sociólogo economista, era convencido de que não se pode compreender a sociedade sem referência ao funcionamento do sistema económico, nem compreender a evolução do sistema económico negligenciando a teoria do funcionamento social.
- A noção de classe social na obra de Marx assume um conteúdo específico e central, podemos achar como epicentro da sua progressão teórica, o sentido do “nós” contra o “eu” exagerado, tendo em conta, todavia, os contornos e as consequências que daí podem advir se não se gerir bem a reflexão e a respectiva acção.
- A visão que Marx tinha da sociedade capitalista é uma visão, pode dizer-se, que ainda hoje abre outros horizontes existenciais neste mundo de democracias alicerçadas numa nebulosidade de capitalismo selvagem.
- A sociedade capitalista para Marx, tem um carácter antagónico e contraditório a partir do conflito existencial entre proletariado e capitalistas.
- O modo de produção caracteriza a sociedade tendo a luta de classes como o momento fecundo para o progresso social, é como que uma visão profética que dá importância particular e justa à luta competitiva ordenada segundo o procedimento democrático que se deseja mais humano ao possibilitar uma existência digna tanto para o (a) empregador (a) como para o (a) a empregado(a).
A classe é o conjunto de agentes que, no processo de produção, estão nas mesmas condições. Uma vez que a situação em termos de propriedade ou não dos meios de produção é que determina a classe social. As relações de produção equivalem às relações de classes sociais.
Podemos ler no pensamento de Marx a preocupação pela defesa dos direitos do homem tanto da classe que na sociedade dos indivíduos capitalistas apenas dispõem da sua força de trabalho como dos detentores dos meios de produção, porque ambos no sistema capitalista vivem desumanizados ou numa situação de desumanização que podia ser considerada como alienação.
Nestas relações sociais atribui-se ao proletariado uma missão específica na história em prol do desenvolvimento e progresso social para uma sociedade renovada. Como estamos a ver Marx é a favor e grande defensor do progresso humano social em vista aos direitos dos explorados como força de trabalho e dos despidos de si próprios como e por serem proprietários dos bens de produção e pela procura desenfreada do lucro, a mais-valia.
Analisando/colocando Marx no seu tempo, podemos entender o seu pensamento – está enquadrado/localizado no período em que os operários estavam completamente desprotegidos na sua relação com os proprietários dos meios de produção.
Na visão de Marx a vida económica é acicate para a luta política cujo fim/finalidade é a extinção da exploração do homem pelo homem. Uma visão assim, nos nossos tempos é fecunda para a implementação e concretização do projecto dos direitos humanos e de todos os povos.
Não basta pertencer à mesma classe é ainda imperioso ter consciência da situação que e em que se vive (tanto um como o outro). A Consciência de classe é importantíssima.
Segundo estudiosos de Marx, a distinção binária de classe dominante e classe dominada é neo-marxista, em Marx encontramos esta preocupação pelo homem despido de humanidade – tanto o capitalista servidor do capital – possuído pela força no capital que ele não controla, como o proletário que vive alienado (alienado do resultado do seu trabalho e alienado porque não pode viver sem esta relação com o capitalista).
Em Marx encontramos esta preocupação pelo homem tido como tal apenas e sobretudo como personagem no teatro económico. Se bem que ele o coloca nesta mesma dependência absoluta do processo de produção, Marx lê na sociedade a desumanização por causa do desenvolvimento do capitalismo. A luta de classe tem como finalidade a libertação das classes para uma sociedade sem indivíduos despidos de humanidade nem pelo imperativo do lucro, nem pelas exigências do viver ou da vida, da subsistência e sobrevivência.
A luta de classes vista assim é como que um processo de ré-humanização: É uma visão profética mas não basta nem se deve bastar. Para a sua realização é necessário que esta perspectiva seja auxiliada por visões humanistas com fundamentos cristãos, por exemplo, que não relegam para segundo plano a pessoa humana e a sua dignidade fundamental.
O pensamento de Marx, como base para implementação de uma política social justa fundada e alicerçada na justiça social, se bem que esta justa orientação ficou ofuscada pelo pendor materialista da sua Filosofia, dá a necessidade de recorrer a outras visões e perspectivas para libertar o pensamento de Marx do materialismo humanista ou melhor ainda de humanismo materialista absoluto.
Entretanto, Marx não deixa de ser um pensador a ler e a ter em conta no mundo de hoje para o descobrirmos como um dos autores recomendados e a recomendar para desmontar as armadilhas e desvelar os segredos do pensamento que é alicerce do capitalismo escondido em certas democracias desprovidas de humanismo integrado e integrante.
Pois, nasce e se põe/coloca no centro da sua abordagem e pensamento a contradição existente na sociedade moderna à qual ele chama de capitalismo. Marx é um crítico e analista profundo do capitalismo é bom tornar mais uma vez patente que os termos proletariado e capitalistas são propriamente do vocabulário marxista mas não de Marx.
Todavia, são estas classes que no pensamento de Marx constituem o centro e o foco do conflito que caracteriza as sociedades capitalistas. Esta relação conflituosa além de ser o troco principal das sociedades modernas é um momento histórico fecundo para o nascimento de uma outra etapa na história da humanidade.
Marx, parece-nos que tem uma visão optimista doseada de algum realismo da história sobretudo quando na sua interpretação encontra no carácter contraditório ou antagónico da sociedade antecedente à sociedade ideal um factor de desenvolvimento histórico.
Constituem base indispensável desta interpretação histórico-social os seguintes “factos” e tratados: O Manifesto Comunista; o Prefácio à Contribuição da luta de classes para a crítica da economia política, A Miséria da Filosofia e o Capital.
Na interpretação de Marx podemos encontrar subsídios para o labor político no sentido da implementação da justiça social que é uma das metas a alcançar depois do capitalismo. Entretanto, por causa do materialismo e do ateísmo é urgente buscar outras perspectivas que ajudem a assumir uma política que considere o ser humano na sua integridade e na totalidade das suas dimensões e necessidades, sem menosprezar nenhuma. A nossa proposta, pois, é que Marx ajuda a despertar a humanidade de hoje para aquilo que podemos esquecer na análise da vida humana e universal deste tempo. Mas o facto de o propormos como um despertador, não o constitui, ao mesmo tempo, em autor e depósito das soluções e decisões para os problemas que a humanidade contemporânea enfrenta.
Diversificado e faseado, ora, quando este pensador põe ao de fora a contradição entre as forças e as relações de produção quando insiste no capitalismo de produção, ou seja o capitalismo cuja tendência é de “criar” e produzir sem cessar meios de produção mais poderosos em vista ao lucro ou a mais - valia, mas as relações de produtividade e a repartição dos rendimentos não se transformam ao mesmo ritmo, o mesmo é dizer que não há justiça, está em contrapartida a propor que o capitalismo é apenas uma etapa de transição na história da humanidade, pois não é o ideal humano.
O pensamento de Marx é como que a denúncia da proporcionalidade injusta que consiste no seguinte: a progressão/crescimento das riquezas e a miséria crescente da maioria, ou seja, a medida que os ricos ficam cada vez mais ricos e eles são a minoria, também continua a crescer a miséria da maioria.
Um pensador que denuncia este estado da realidade social e histórica é porque tem no seu fundo o anúncio de um momento digno e propício onde a justiça social é um facto – anúncio de uma vida não só diferente, mas, melhor porque constitui o ideal: em que a produção material e de bens corresponda com a sua justa partilha e distribuição.
Um agir político e social iluminado ou que busca as suas bases na interpretação histórica e social de Marx, pode  com o auxílio por exemplo de uma perspectiva política radicada na  Antropologia Cristã, perseguir  o ideal da implementação de direitos sociais para todos cuja ideologia é um humanismo são e integral no labor árduo da organização social em que os objectivos e as finalidades incidem sobre a erradicação de contra valores como a pobreza, a miséria, o analfabetismo, doenças, injustiças, a corrupção, etc.
Na sua interpretação histórica social inclui uma visão profética em relação a política e ao Estado. Na visão de Marx a política e o Estado estão em segundo plano, são resultados de conflitos sociais cuja origem está radicada nos fenómenos sociais e económicos que são o motor do desenvolvimento na sociedade, em si mesmo.
Ou seja, Marx é contra o capitalismo dos privados e o capitalismo do Estado ou de algumas classes sociais dominantes, possuidores de meios de produção, da burocracia e da militância.
Se bem que a visão de Marx encaminhou alguns marxistas para um colectivismo totalitário, o que está no cerne do pensamento profético do autor de “O Capital” é o ser humano, e a sua dignidade[5].
Sendo assim a exploração do homem pelo homem não encontra o seu fim ou erradicação com a simples supressão da propriedade privada própria de um capitalismo em que o lucro é o critério supremo e ilimitado; mesmo quando esta apropriação passa para um poder político ou para o Estado, a exploração do homem pelo homem continua na sociedade.
Na visão de Marx, tendo em conta o dinamismo social as expressões “divisão de trabalho” e “propriedade privada” são equivalentes podem ter o mesmo resultado que é: a exploração da maioria pela minoria.
Contudo, Marx ao projectar uma sociedade sem exploração do homem pelo homem, não era um visionário irrealista, ele tinha em conta na tal dialéctica da história que até chegar ao ideal humano – à sociedade de homem novo – vai se passar por outros modos de viver em sociedade. Sendo assim, respeitando a visão de Marx, o socialismo dos marxistas não é ainda o sistema de uma sociedade ideal[6].           
O ideal que está no fundo do pensamento de Marx é chegar a um tipo de sociedade onde cada um trabalha segundo as suas possibilidades e recebe segundo as suas necessidades: o comunismo definitivo. Isto implica uma série de reformas sociais, económicas e políticas que partiriam pela conversão das mentes ou seja, do próprio homem, da própria pessoa humana, o que leva a rebuscar o sistema de vida das comunidades da Igreja no momento do seu nascimento, segundo o Livro dos Actos dos Apóstolos: um certo comunismo cristão.
Propomos nós que ter Marx como base para implementação de um tipo de governo por exemplo é preciso rebuscar a obrigatoriedade de a política e a economia se submeterem a uma visão antropocêntrica da história que respeita e promove o ser humano em todas as suas indispensáveis dimensões. Pois, nota-se que o que move a interpretação de Marx e a sua visão de uma sociedade sem Estado é a preocupação quiçá excessiva pelo ser humano, o homem e a mulher não só do seu tempo mas de todos os tempos e lugares. Desta forma o político tem que ter um conhecimento da realidade social e económica, da nação de que ele é servidor e do povo a que está a servir e/ou a representar.

4.2.            Cadeias (de Produção) do Capitalismo: Um Subsídio a não Dispensar

Em Marx podem ser assinaladas três principais figuras de dominação; a exploração, a divisão do trabalho e a alienação.

4.2.1.      Exploração

Antes de mais, em Marx a dominação consiste na exploração em que consiste pois a exploração? «Esta consiste na extorsão pelos exploradores do Trabalho a mais produzido pelos explorados».[7]
O que está na base desta conceptualização é a teoria do valor em relação ao trabalho – a sua proporcionalidade ou não, como já vimos nas críticas que Marx desenvolve contra Proudhon.
Esta teoria busca a sua inspiração nos economistas clássicos como David Ricardo (n. 1772-1823). Segundo o qual o trabalho é a fonte das riquezas.
A exploração sucede pelo facto da extorsão da mais-valia (ou o sobre-valor).A mais-valia consiste na diferença entre o valor criado pelo trabalho do assalariado e o salário que ele recebe para garantir a reprodução da sua força de trabalho. «A mais-valia serve então para alimentar o processo contínuo de acumulação do capital»[8].
O que Marx critica não são casos isolados; é que este tipo de exploração é  o que caracteriza o sistema capitalista. Na análise de Marx o capitalismo é a relação social global de dominação entre classes.
Nesta definição de facto económica, Marx vê a dominação localizada não só na noção mais também no fenómeno da exploração capitalista ou própria do capitalista.
É a análise que encontramos nas obras de carácter mais económico na segunda parte da sua vida; obras como “O Capital”. Para Marx esta maior dominação que é a exploração económica influencia e se reflecte nas outras dimensões da existência humana como a família, o Estado, a política, etc. Estas dimensões e outras que não estão citadas aqui estão dependentes das relações de exploração no trabalho.
Reside aqui algum economicismo ou outra denominação que caracterize esta insistência na sobre avaliação ou saliência da dimensão económica na análise das relações sociais.[9]
Autores como John Ester põem em evidência que a noção de exploração não constitui apenas um meio de análise numa perspectiva científica das realidades existentes mas também têm uma forte componente ética, de condenação moral. Outros ainda mostram como Marx insiste nos mecanismos imorais  pelos  quais a desgraça da maioria dos pequenos faz a felicidade da minoria dos grandes.
Esta análise ética da exploração injusta desagua e termina numa política da luta de classes e da revolução proletária.

4.2.2.      Divisão Social do Trabalho e Despotismo da Industrialização e da Tecnocracia

É no livro 1 do Capital, onde Marx desenvolve, ao descrever a fábrica capitalista, uma outra luz sobre a dominação – que também entra na dinâmica da exploração capitalista, porém tem algo de específico: a divisão social do trabalho manual e intelectual.
Aqui Marx possibilita ainda hoje a insistir na dominação que anda ligada ao poder, pode ser político ou económico. Ou seja, na fábrica os operários estão em oposição ao poder “intelectual”, a classe dos que pensam porque têm o capital económico e político e até científico – em alguns e muitos casos, que detém toda a produção. Aqui reside a força do poder que domina os operários, ou seja a classe dos caídos à margem do caminho do desenvolvimento concebido e que está a ser promovido pelo grupo detentor da força opressora. Fala-se então de «Desportismo na divisão do trabalho e na manufactura»[10]. Neste desporto, naturalmente, o mais forte vence, manda e comanda.
Na grande indústria a dominação chega ao cume, dado que nela existe «a divisão ou separação entre trabalho manual e as faculdades intelectuais da produção que ela transforma em poderes do capital sobre o trabalho»[11]. Trabalho manual é próprio da maioria empobrecida até antropologicamente, mesmo que não seja realmente, todavia, mentalmente os desprovidos das ditas faculdades mentais se julgam menos até na sua dignidade e personalidade, pois, o sistema da sociedade em que se vive assim impõe e dita.
Como dizíamos, em síntese aqui a dominação está associada à noção de poder e poderes.

4.3.            Alienações

Neste sentido a figura e consequência de dominação e momento de exploração é a alienação. O indivíduo, membro de uma sociedade, vive uma divisão na sua personalidade: entre ele e o seu “eu” ou a consciência de si no “nós” global e restrito; ele vive um desapossamento de si mesmo. Aqui se encontra o outro lado da dimensão principal da alienação humana. [12]
O homem fica dividido, o indivíduo fica em pedaços e está reduzido em ser «uma mola automática de uma única operação» ditada pela realidade sócioeconómica.[13] 
Nos textos juvenis, Marx concentrou a sua crítica sobre ao que se chamou de alienação política que consiste na diferença entre o homem na vida pública e o homem no privado. Ou seja a emancipação promovida na Revolução Francesa na esfera política é apenas uma camuflagem. Não é uma emancipação integral uma vez que reconhece apenas a igualdade jurídica e política dos homens na esfera pública, entre tanto reina uma desigualdade social e económica na esfera privada.

4.3.1.      Alienação no Trabalho

Alienação aqui é estritamente no sentido etimológico e original: alienus que significa o que pertence ao outro. O trabalho alienado consiste em: o produto do trabalho opõe-se ao trabalho como um ser estranho, como uma força independente do produtor. O produtor com sua força não usufrui justamente do resultado do seu trabalho.[14]

4.3.2.      Alienação Religiosa

Consiste no facto de a religião ser como que uma actividade própria da imaginação, no cérebro e no coração humano; a religião opera sobre o indivíduo independentemente de si próprio, como uma actividade estranha, divina ou diabólica.
Existe uma analogia entre alienação no trabalho e alienação religiosa; na primeira o homem é criador dos produtos de trabalho e estes sendo estranhos dominam o homem como trabalhador; na alienação religiosa o homem é criador dos deuses e estes acabam por lhe aparecer como entidades estranhas ou estrangeiras e neste sentido o dominam e atormentam e, por conseguinte, o homem perde a capacidade de controlo de si mesmo; é o resultado da idolatria: do e no dinheiro, do ou no sexo, da ou na política……etc.
Marx, podemos entendê-lo dentro das ciências sociais como alguém que trouxe para este âmbito de investigação científica novas exigências. As ciências sociais trouxeram nos tempos de hoje na esteira das contribuições filosóficas luzes renovadas sobre a questão da dominação apelando por trabalhos empíricos (históricos, estatísticos e inquéritos no terreno). Pois que elas apontam e propõem que figuras teóricas da dominação devem merecer uma investigação mais precisa e objectiva – desde o diagnóstico para hipóteses que incidem sobre conclusões de casos concretos da exploração do homem pelo homem ou da simples dominação da maioria pela minoria, para se trabalhar na conveniente, respectiva e própria ou devida terapia que exige o passo seguinte e indispensável, o da verificação. É um trabalho que implica o emprego da metodologia das Ciências sociais como a Sociologia, o Serviço Social que não dispensa a destruição dos obstáculos epistemológicos dos fenómenos sociais como o etnocentrismo, o naturalismo, o individualismo, o tribalismo, o racismo, a miopia religiosa – o fanatismo… Neste labor científico interdisciplinar e pluridisciplinar é imperioso ter em conta então as condições da ruptura com o senso comum e as estratégias  - as técnicas documentais e não documentais; a observação participante e não participante ou melhor ainda sistemática e as etapas da investigação científica propostos e definidos por estudiosos como Augusto Santos SILVA e José Madureira PINTO que organizaram com o título “ Metodologia das Ciências Sociais”.

4.4.            A Filosofia de Libertação e a Promoção de uma Acção Sociopolítica Humanizante (Libertadora)

A Filosofia da libertação consiste em descobrir o elemento ou a realidade, o facto ou a condição que oprimem ou são a origem da opressão de um indivíduo ou motivo/razão ou origem da dominação de uma comunidade humana. Por exemplo, por que as elites são o centro de tudo e de todas as decisões e as massas são sempre a periferia? Por que a classe burguesa decide e a classe operária e o povo limitam-se a obedecer?
A questão tem as suas raízes no modo como se vive a relação “eu” e o “outro” ou a “outra” pessoa. A outra pessoa é o pobre (no capitalismo e não só); o dominado e subjugado no sistema absolutista e ditatorial; o negro escravo no momento da escravatura. O “outro” oprimido, dominado, torturado e a sua dignidade é destruída, se lhe é despida, efectivamente, reclama justiça.
Neste sentido surge a necessidade de um grito e de uma acção pela justiça que desemboca na dignidade real e não fictícia de todos; ou seja, ser aceite como valor e ser descoberto como pessoa, embora diferente: “uma resposta responsável ao apelo do outro”[15] As exigências da responsabilidade de assumir o outro ou a outra.
Paul Ricouer citado por Enrique Dussel sustentava: “Falta-nos conceber aqui um conceito cruzado de alteridade que faça justiça alternadamente à primazia da estima do eu e aquela da convocação pelo outro”[16] Ou seja, é necessário termos consciência do valor do outro e, neste sentido, o outro ou a outra passam a ser o fundamento do acto de justiça ou de uma acção justa na nossa relação com ele.
Estão também nesta perspectiva de abordagem e da apresentação da Filosofia da libertação Levinas, Marcuse e a Escola de Frankfurt.
Nós não nos vamos deter aqui a analisar as diversas vertentes e maneiras de entender e empreender uma filosofia de libertação, mesmo daqueles que são uma reacção e um exame crítico de Hegel, tais como: Schelling com a sua Filosofia da Revelação desenvolvida nas aulas de 1841 em Berlim que administrou a muitos que se tornaram autores a não dispensar uma abordagem antropológica e ética da Política, como: Kierkegaard, Engels, Bakunin, Fuerbach e outros. Vamos, pois, concentrar-nos no pensamento de Marx, o autor do Capital , na sua maturidade multifacetada e ainda segundo a visão de marxólogos mais recentes que aprofundaram o seu pensamento já com influências do capitalismo selvagem dos nossos tempos  que nos possibilita interpretar Marx  de uma maneira integral e mais objectiva.
Em Marx encontra-se não só a perspectiva da filosofia da libertação mas também as exigências de um desenvolvimento crítico e criativo, sobretudo, pela sua reflexão sociopolítica cultivada num período histórico em que a maioria das pessoas ou do povo vivia na miséria, como hoje em alguns Países e em algumas cidades.
Marx encaminha a sua filosofia da libertação numa crítica ao capitalismo, como já foi dito nas páginas anteriores; Deste modo, encontramos em Marx a ligação intrínseca e inseparável entre a filosofia da libertação, a economia, a política e a realidade história[17]
Fazendo uma reinterpretação hermenêutica – filosófica e cronológica da obra e do pensamento de Marx, nota-se e constata-se que nos seus últimos momentos (entre 1857 a 1882) é mais antropológico, ético e anti-materialista desenvolvendo acima de tudo uma filosofia económica humanizante (humanista) excepcional, se bem que aínda nas amarras do materialismo. Desenvolveu uma visão filosófica e um pensamento sociológico em busca de critérios e estratégias de como os homens podem transformar a sociedade na qual eles vivem, sendo ao mesmo tempo os próprios produtos e efeitos da caminhada e das transformações dessa mesma sociedade.
“A originalidade da sua obra é a de propor uma visão global das relações sociais e da transformação social, fundada na mudança das condições de produção dos bens numa sociedade”, segundo a interpretação de alguns sociólogos actuais.[18]
É neste sentido que propomos um olhar da filosofia de libertação de Marx com perspectivas de promover uma acção sócio – política libertadora com princípios fundamentais e alicerçados na Doutrina Social da Igreja. O libertador, pois, não é Marx nem o que ele propõe. Ou seja, a libertação da pessoa  humana de todas  as situações e fenómenos sociais que o sufocam e desumanizam, não é uma empresa pura e simplesmente humana e de homens; é preciso redizer isto a Marx e aos marxistas.
A acção sócio – política implica antes de mais a libertação do próprio político que se deve empenhar tanto no processo de humanização e dignificação dos seus concidadãos que investir em preconceitos da assumpção do poder com intenções absolutistas e ou utilitaristas, sobretudo, se se apodera do poder como se fosse uma propriedade privada ou de um indivíduo ou de um grupo.
Tal concepção de política e de acção aponta para as exigências de um serviço a favor dos menos afortunados, os marginalizados das grandes e pequenas metrópoles, os pobres e empobrecidos e até mesmo dos ricos de tudo mas menos de humanismo sadio cuja acção se encaminha para o desenvolvimento integral e integrante, humano, divino, harmónico e cósmico, em coexistência ecológica que não anula a própria identidade quando respeita a do outro, nem dispensa as próprias convicções na medida em que considera as dos outros.
Esta Política com a respectiva acção social andam em correlação e de mãos dadas com a Ética que engrandece e tão urgente neste mundo da globalização, um dos seus fundamentos e pilares é a dimensão e a consideração do outro ou da outra pessoa alicerçada numa concepção antropológica que sustenta os Direitos de todos, a sua dignidade, identidade, sacralidade, em vista do bem comum e da igualdade que não dispensa as diferenças – por isso não massifica – possibilitando que toda a população seja promovida e formada no sentido de ocasionar a sua participação no processo do desenvolvimento humano de modo convicto, consciente, responsável e activo.
 Sendo assim, é urgente e inadiável em tal perspectiva sócio – política sustentar o direito de participação e uma cidadania radicados na própria identidade e personalidade com subsequentes liberdades humana e civis como os de expressão e de pertencer a grupos ou associações de natureza política.
Rebuscando-se em Marx o autor de O Capital e também da Miséria da Filosofia nos deparamos, a princípio, com a impossibilidade de uma concepção de governo ditatorial, se bem que os seus exageros e excessos podem encaminhar para aí, por exemplo ocasionar um individualismo personalista (ditadura do eu) ou um comunismo que anula a dimensão do eu como identidade e personalidade a cultivar e promover e salvar neste mundo em vista do eterno.           


[1] Cfr. G S. 1
[2]Cfr. Cesare MARCHESELLI.  “Areópago da Missão: Revisitação Bíblico – Teológica” in  Pontifícia União Missionária – Secretariado Internacional. AREÓPAGOS DA MISSÃO CONTEMPORÂNEA – Estudos Para a Missão, Lição 1.
[3] António MARTO. “Descobrir a beleza e a alegria da vocação cristã”.  P. 14.
[4] Aron, 1991, p. 142-145
[5] Cfr. BUIL, J. M. Abad – Juízo Crítico sobre o Capitalismo (1980). Pp. 8-9;  ARON, Raimund. As Etapas do Pensamento Sociológico. Pp. 148-149. 
[6] Cfr. Idem. Ibidem.
[7] CORCUFF, Philip. Filosofia Política. PP. 74-75.
[8] Ibidem.
[9] Cfr. Actes de la Recherche en Sciences Sociales nº 55, Novembro 1984.
[10] Marx. O Capital, Capítulo XIV, em OEUVRES I. P. 904.
[11] Ibidem. Capítulo XV. P. 956.
[12] Cfr. CORCUFF, Philip. Filosofia Política. P. 77.
[13] Ibidem. P. 76.
[14] Cfr. Manuscritos de 1844, P. 58.
[15] DUSSEL, Enrique. Filosofia da Libertação: Crítica à Ideologia da Exclusão. P. 19. 
[16] Ibidem. P. 20.
[17] Cfr. ETIENNE, Jean et allii. Dicionário de Sociologia: As noções, os mecanismos e os autores. P. 205.
[18] ÉTIENNE, Jean et alii Op. Cit. p. 204

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